















EXPOSICOES
o que ja passou por aqui
Em um cômodo, existem vários umwelts.
Termo cunhado pelo biólogo Jakob von Uexküll em 1909, umwelt refere-se ao mundo que descreve a experiência subjetiva de um organismo moldado por funções essenciais à sobrevivência. Essas funções criam padrões harmoniosos para a existência de cada organismo, resultando em uma adaptação completa ao seu próprio universo. cômodo representa o encontro de duas exposições solo das artistas Larissa Laban e Maíra Senise, ocupando os dois andares do CAROÇO, com curadoria de cabinetbrain.
A palavra "cômodo" pode manifestar-se de duas maneiras: como um substantivo, referindo-se a uma divisão específica dentro da moradia; ou como um adjetivo, caracterizando aquilo que proporciona conforto e atende às necessidades. Explorando essa pluralidade da palavra cômodo, ambas artistas nesta exposição mergulham em seus próprios umwelts pessoais através de suas telas e dos personagens que elas criaram. Cada organismo tem seus próprios órgãos sensoriais, processos cognitivos e experiências passadas distintas. Em uma única sala, vários umwelts podem coexistir.​ Portanto, aqui o termo umwelt se desdobra em uma sinfonia visual de animais e objetos domésticos governados por sua própria lógica distinta, permeando um universo desconhecido, visto nos trabalhos inéditos apresentados por ambas artistas. Em seus cômodos distintos, cada artista nos convida a explorar umwelts diferentes.
Começando pelo lado expositivo de Maíra Senise, carioca radicada em Nova Iorque, a artista nos convida a explorar seus cosmos internos, revelando um mundo de cores vibrantes e formas orgânicas. Suas pinceladas expressivas retratam a fusão entre o tangível e o abstrato: podemos identificar aranhas, rosas, laços, planetas, botas, mobiliários e até uma releitura do auto-retrato de Caterina van Hemessen (1528 - 1565). Senise aproveita para situar esses personagens dentro de formatos orgânicos, muitas vezes em algum tipo de cômodo, cercados por inúmeros personagens abstratos e coloridos, flertando com o imaginário entre o reino humano e animal. Este é o umwelt dos personagens de Senise: eles prezam pelo perímetro de seus cômodos e valorizam a simplicidade dos materiais ao seu redor, permitindo que todos tenham seu próprio lugar, já que a artista enfatiza a ausência de hierarquia entre os objetos. O que é considerado pela sociedade como feminino, doméstico e fútil – como glitter, miçangas, esmalte de unha – no universo de Senise é reconhecido como essencial para a sobrevivência, criando o ambiente necessário para que seus personagens floresçam. O uso de personagens repetidos representados por técnicas diferentes enfatizam seu pertencimento.
Se no universo de Senise a divisão dos cômodos em que seus personagens coexistem são bem delineadas, no de Laban eles não existem. Nascida em Cabo Frio, Larissa Laban cria cenários que existem em uma ausência suspendida, com seus personagens flutuando predominantemente em um fundo liso preto, oferecendo aos espectadores pinturas enigmáticas que retratam um mundo liminar. O umwelt desses animais é regido por objetos kitsch, bibelôs, um telefone antigo e um segredo coletivo que todos devem guardar. Talvez aqui, a palavra cômodo se traduza em conforto, mas também em comodismo - seus personagens se adaptam a uma espécie de solidão e se contentam nela. A paleta de Laban, repleta de tons profundos, ressalta a dualidade entre o presente e o ausente, criando uma atmosfera de mistério - procurando o equilíbrio entre o aerógrafo abstrato e a pintura a óleo. Nesse universo, cada organismo se torna um artefato de significados ocultos, e o espectador é desafiado a decifrar o segredo que eles guardam.
Entre os cômodos, podemos entender que a arte de Laban e Senise não fizeram perguntas e nem forneceram respostas. A arte de ambas nos confunde, nos convidando a pensar de forma diferente, deslocando as nossas referências. Em última análise, os personagens criados pelas artistas mostram que a imaginação comunitária é um precursor do conhecimento coletivo, reforçando o que o conceito de umwelt nos oferece: a compreensão de que existem mundos de vida completos além do nosso.
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In a Room, There Are Several Umwelts
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A term coined by the biologist Jakob von Uexküll in 1909, umwelt refers to the world that describes the subjective experience of an organism shaped by functions essential to its survival. These functions create harmonious patterns for each organism’s existence, resulting in a complete adaptation to its own universe. Cômodo represents the encounter of two solo exhibitions by artists Larissa Laban and Maíra Senise, occupying the two floors of CAROÇO, with curatorship by cabinetbrain.
The word cômodo can manifest itself in two ways: as a noun, referring to a specific division within a house; or as an adjective, describing something that provides comfort and meets needs. Exploring this duality of the word cômodo, both artists in this exhibition dive into their own personal umwelts through their canvases and the characters they have created. Each organism has its own sensory organs, cognitive processes, and distinct past experiences. In a single room, several umwelts can coexist. Therefore, here, the term umwelt unfolds into a visual symphony of animals and household objects governed by their own distinct logic, permeating an unknown universe, seen in the unpublished works presented by both artists. In their distinct rooms, each artist invites us to explore different umwelts.
Starting with Maíra Senise’s exhibition, a carioca artist based in New York, she invites us to explore her inner cosmos, revealing a world of vibrant colors and organic forms. Her expressive brushstrokes depict the fusion between the tangible and the abstract: we can identify spiders, roses, bows, planets, boots, furniture, and even a reinterpretation of Caterina van Hemessen’s self-portrait (1528 - 1565). Senise situates these characters within organic forms, often within some kind of room, surrounded by numerous abstract and colorful characters, flirting with the imagination between the human and animal realms. This is the umwelt of Senise’s characters: they value the perimeter of their rooms and appreciate the simplicity of the materials around them, allowing each to have its own place. The artist emphasizes the absence of hierarchy among the objects. What society considers feminine, domestic, and trivial—such as glitter, beads, and nail polish—in Senise’s universe is recognized as essential for survival, creating the environment necessary for her characters to thrive. The use of repeated characters depicted with different techniques underscores their sense of belonging.
While in Senise’s universe the divisions of the rooms where her characters coexist are well-defined, in Laban’s they do not exist. Born in Cabo Frio, Larissa Laban creates scenarios that exist in a suspended absence, with her characters predominantly floating against a smooth black background, offering viewers enigmatic paintings that portray a liminal world. The umwelt of these animals is governed by kitsch objects, figurines, an old phone, and a collective secret that everyone must keep. Perhaps here, the word cômodo translates to comfort, but also to complacency—her characters adapt to a form of solitude and settle into it. Laban’s palette, filled with deep tones, highlights the duality between the present and the absent, creating an atmosphere of mystery—seeking balance between abstract airbrush techniques and oil painting. In this universe, each organism becomes an artifact of hidden meanings, and the viewer is challenged to decipher the secret they keep.
Between the rooms, we understand that the art of Laban and Senise does not ask questions nor provide answers. The art of both confuses us, inviting us to think differently, shifting our references. Ultimately, the characters created by the artists show that the communal imagination is a precursor to collective knowledge, reinforcing what the concept of umwelt offers us: the understanding that there are complete worlds of life beyond our own.
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